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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

No Hospital

Deixe a luz acesa. Talvez as noites fiquem menos escuras e o medo não doa tanto na cama do hospital.
Deixe a porta encostada. Talvez a solidão se escape pela fresta e os barulhos da vida entrem mais cedo na enfermaria.
Fique mais um bocadinho. Assim: a aquecer a frieza da mão que se apaga sobre os lençóis imaculadamente engomados, cruelmente brancos. Conte do mundo, dos carros que engolem as estradas, da pressa de fazer as coisas, dos miúdos que vão bem na escola, do frio que faz tremer as madrugadas, dos próximos capítulos da novela. Fale do mar e das marés e dos segredos que as ondas dizem à praia, quando a cidade se cala e se prepara para dormir. Diga que vai haver futuro, que o sol vai voltar a aquecer os ossos cansados da mesma posição, que a alegria vai chegar porque, quem hoje está aqui, amanhã [o mais tardar, para a semana), vai voltar para casa.
Olhe para eles – são médicos, enfermeiros e cuidadores. Trazem a esperança presa à brancura da bata; prescrevem possibilidades em cada remédio, emprestam uma bengala em cada palavra e, em cada olhar, uma nova razão para não morrer.
Vê a mão de Deus atrás das deles? Talvez nem eles A vejam. Mas Ela está lá, no carinho que oferecem a quem sofre, aconchegando quem não se levanta, na ternura com que compõem o cabelo de quem o tem colado à almofada, no beijo, no olhar que fixa o aparelho que ajuda a viver, na mão que ajuda a partir.
Fique mais um bocadinho. Quem está no hospital precisa muito de si, da sua atenção, da voz da vida que se colou à sua voz, da saúde que o seu corpo traz, do seu silêncio, da sua força.
Tem de se ir embora? Está bem. Volta amanhã?
Não se importa de deixar a luz acesa? E, por favor, deixe também a porta entreaberta. Pode ser que assim a dor doa menos e a noite pareça mais curta.
Muito obrigada por ter vindo. Até amanhã.

1 comentário:

  1. Dizem que as noites são a parte mais difícil; arrastam-se... arrastam-se. E espera-se que o sono venha depressa para trazer depressa a manhã.

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