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sábado, 15 de janeiro de 2011

O FIM DA FESTA


Apagaram-se as luzes. De repente, a noite ficou mais noite e a cidade mais triste. Fica sempre no ar esta nostalgia, quando a Festa se quer ir embora, antes de se acabarem os jantares, as
- continuações!
ainda vestidas de janeiro e o varrer dos restos No Santo Amaro.
As lojas já guardaram o que sobrou e fazem saldos do que já não faz falta para este ano. Na minha casa, a lapinha ainda está montada, a árvore ainda me pinta os serões de saudades, os sinos ainda tocam, nos montes de papel pintado que a humidade fez descair.
Os Reis vieram, cantaram e regressaram às suas terras, levando com eles o cantar das janeiras, a alegria do ano novo, as broas e os licores que ainda havia nos armários. Voltámos à vida real, ao tempo quase sem tempo para se viver.
Os olhos do espelho perguntaram por mim. Queriam saber se os meus olhos tinham uma luz diferente. Os meus olhos responderam que não, que está tudo igual, que o meu mendigo continua na mesma esquina, com a mão estendida e o olhar cansado, que os meus braços continuam à procura de abraços, que não tive roupas novas para vestir as minhas palavras, que não quero desmanchar o presépio que comecei a construir dentro de mim.
Os olhos do espelho fixaram os meus. Queriam saber o que eles mostravam: se abismo, se medo, se esperança. Os meus olhos disseram que sim, que tinham aprendido a sobrevoar o medo e a olhar a escuridão, com a esperança do Menino que tinha adormecido no berço do meu olhar. Os olhos do espelho mostraram aos meus que, afinal, ainda havia muita coisa para fazer, antes de dar por terminada a Festa do Natal.
Lá fora, os colares das árvores e as gargantilhas das ribeiras já perderam o brilho, mas os olhos do espelho querem continuar a brilhar. Têm lá dentro a alegria. Guardam os sonhos brancos de Deus. Guardam a vontade de ser feliz. Guardam o silêncio das ruas que, dentro deles, se quer travestir de paz.

3 comentários:

  1. Os reis já partiram e só nos resta varrer os armários com a vassourinha de Santo Amaro.
    Amanhã é já Santo Antão.

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  2. A minha árvore já se despiu. E no sítio fica um vazio que, durante algum tempo, é difícil de preencher.

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  3. Pois é, amiga. REsta-nos a esperança de que esse e outros vazios vão sendo preenchidos. Devagar, é verdade, mas o buraco acaba por diminuir de tamanho.

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